Um dos artífices da MPB, Jackson do Pandeiro tem 50 anos de carreira reunidos em álbum duplo
Arquivo
Jackson do Pandeiro, que morreu em 1982, teve que enfrentar, no Rio, o ciúme do rei do baião Luiz Gonzaga, que o chamava de palhaço
Crítica/disco
Com um ano de atraso - vá lá, alguns meses - sai uma modesta homenagem ao cinqüentenário de carreira do paraibano Jackson do Pandeiro (1919-1982), um dos grandes artífices da MPB. O CD duplo Jackson do Pandeiro - 50 anos de ritmos (EMI) - montado pelo produtor Marcelo Fróes com 50 fonogramas compilados da passagem do cantor/autor pela finada gravadora Copacabana - fornece um bom panorama de sua carreira errante, iniciada em novembro de 1953 (ele passaria por outras cinco gravadoras) com a explosão do 78 rotações contendo de um lado Forró em Limoeiro (Edgar Ferreira) e de outro Sebastiana (Rosil Cavalcanti).
Ocorreu uma situação oposta a estes tempos espalhafatosos de Celebridades e BBB. Com o disco estourado no Sul, mais de 50 mil cópias vendidas antes do carnaval de 1954, o ex-padeiro José Gomes Filho, apelidado Jackson por conta de um ator de cinema americano que admirava, refugiou-se em sua terra com medo de encarar o sucesso. Também havia no caminho o pavor de avião. Quando ele finalmente desembarcou no Rio, vindo de uma longa viagem de navio, em abril de 1954, dividiu o trono da música nordestina com o soberano do baião, Luiz Gonzaga.
Não foi uma conquista pacífica. Com outros êxitos, entre cocos e rojões, além de Sebastiana (recriada por Gal Costa em seu disco de estréia tropicalista, em 1968), A mulher do Aníbal (Genival Macedo e Nestor de Paula), 1 X 1 (Edgar Ferreira), regravado pelos Paralamas do Sucesso em Bora Bora (1988), e mais 17 na corrente (Edgar Ferreira e Manoel Firmino) e até Forró em Caruaru, de Zé Dantas, parceiro do concorrente (todos incluídos na antologia), Jackson impôs-se e causou ciúmes. ''Parece um palhaço, um moleque pulando no palco'', teria dito de sua maneira de dançar o coco o rei do baião, relatam Fernando Moura e Antonio Vicente na biografia Jackson do Pandeiro - o rei do ritmo (Editora 34, 2001). Os dois nunca se bicaram e Jackson fez questão de delimitar seu latifúndio no programático Coco do Norte (Rosil Cavalcanti), de 1955. ''Tem caracaxá, zabumba, ganzá/ poeira de chão/ coqueiro fazendo improvisação/ batendo umbigada na palma da mão/ isso é coco do Norte/ nunca foi baião'', distingue a letra.
Iniciado como cantor de samba ele teve outro rival na divisão de fraseado e voz negroide, Jorge Veiga, que teria, segundo a biografia, preparado até um trabalho de macumba para prejudicá-lo. Foi comediante no rádio pernambucano até descobrir que os cocos cantados profissionalmente por sua mãe, Flora Mourão, seriam um filão a ser explorado com sucesso.
Mas a compilação, que omite a data dos fonogramas, não fecha o repertório em cocos estupendos como Falso toureiro (José Gomes/ Heleno Clemente), de 1956, Coco de improviso (Jackson, Edson Menezes/ Alventino Cavalcanti), de 1957, e seu irmão mais catimbado, o rojão, tipo Cabo Tenório (Rosil Cavalcanti), de 1957. Há muitos sambas carnavalescos, como o melhor de todos, Vou gargalhar (Edgar Ferreira), que tomou o carnaval de 1955, e uma inusitada parceria com o baiano Riachão em Meu patrão (1957). Marchinhas sapecas como Me dá um cheirinho, de Sebastião Lopes (''o delegado não quer que cheire isso não/ pode haver confusão no salão''), de 1956, ou Velho sapeca (Antonio Barros/ José Saccomani), de 1957. E ainda Micróbio do frevo (de Genival Macedo, e não Lacerda, como diz a ficha técnica), o malicioso Xote (escrevia-se Chote) de Copacabana, do próprio. E ainda batuque, como O canto da Ema, de um João do Vale estreante com Aventino Cavalcanti e Ayres Viana, e um curioso baião de viola, Vassoureiro (Rosil Cavalcanti), de 1957, levado só no instrumento e vocal.
Jackson também gravou baiões convencionais (Baião mineiro, Eta baião) nesse início produtivo de carreira na Copacabana (entre 1953 e 1958). Em sua decolagem para o êxito duradouro, além da genialidade como intérprete divisor de águas e de bons lampejos autorais, ele contou com compositores como o Gordurinha do tragicômico Meu enxoval e do megaclássico Chiclete com banana (não incluído na seleção por ser de outra gravadora) e principalmente Rosil Cavalcanti, com quem formou a dupla Café com Leite no início da carreira, e o politizado Edgar Ferreira, que musicou para ele a carta testamento de Getúlio Vargas, o belíssimo Ele disse, incluído no repertório de Caetano Veloso.
E como escreveu Rosil no Coco social, que cita os colunistas Jacinto de Thormes e Ibrahim Sued, o ritmo e seu principal intérprete derrotaram o apartheid nativo. ''Ele é pernambucano, do canavial/ veio pro salão/ é social''.
Comentários
Posso lhe afirmar q José Gomes da Silva (Jackson do Pandeiro) nasceu em Alagoa Grande - PB.
Vc me deixou curioso... pode me dizer aonde foi q vc viu ou ouviu dizer q ele era de Quixeramobim? Que eu saiba Jackson nunca veio ao Ceará.
Forte abraço!
desde ja agradeço
Não podemos afirmar q o forró é paraibano ou cearense ou qq coisa do gênero. As fronteiras geo-políticas q dividem os estados são muito limitadas para definir as práticas culturais das pessoas q os habitam.
Não acredito que haja uma "cultura paraibana" ou coisa do tipo. As práticas culturais encontradas na Paraíba são tb encontradas em outros lugares do mundo, com algumas variações. Afinal, a cultura é uma construção coletiva, pública, feita pelas pessoas de todo o mundo.
O q temos é um grupo de pessoas q desejam eleger o q pertence e o q não pertence ao meio sócio-cultural em q vivem. Mas essa postura é fruto de pouco ou nenhum conhecimento da história.
Abraços fraternos!